Revista Literária e Concurso Literário da ACLe
Participei do XX Concurso Literário da Academia Criciumense de Letras e fui classificada com Menção Honrosa com o conto: Encontrei um Orixá.
CONTO: ENCONTREI UM ORIXÁ
Comecei a sentir um arrepio, a casa
ficava num sítio e o caminho era longe da estrada e até a casa dele devia ter
dois quilômetros. Tentei me acalmar, mas lembrei das histórias de assombração
de meu avô. Droga, porque isso veio na minha mente agora? Comecei a rezar e
pedir auxílio para os santos e anjos.
Olhei pra frente, tentando parecer
calma e avistei um senhor sentado num tronco de madeira, fumando com chapéu e
uma capa. Continuei olhando aquela figura estranha, mas pensei: deve ser um
vizinho esperando alguém vir a pé também. Mas não vi ninguém descer do ônibus e
andar na mesma direção que eu.
As pernas começaram a tremer ainda
mais, fui chegando perto e me arrepiando dos pés a cabeça e já me arrependendo
da minha visita surpresa para o namorado.
Dei boa noite ao senhor tentando
aparecer tranquila e ele me disse:
- Boa noite, moça bonita, a noite
está linda mesmo, essa lua é para iluminar teu caminho.
Olhei fixamente no olho dele, notei
que era um senhor alto, bonito, tinha uma capa preta com fundo branco, o chapéu
era preto também e fumava um charuto com cheiro bom. Perguntei:
- O senhor mora aqui perto? Tem
várias casas nesse vilarejo né? Eu estou indo ao encontro do meu namorado que
mora aqui também. Ele deve estar chegando.
- Sim eu sei. Disse-me ele.
- Você o conhece? Já me viu por
aqui então.
- Sim sempre estou vendo tudo e
cuidando de tudo e de todos.
- Então o senhor é o vigia da rua?
- É, como se fosse.
- Como é o seu nome?
- Me chamam de Flerity, atuo na
esquerda da lei, abrindo caminhos daqueles que são merecedores dessa dádiva.
- Como? Não entendi!
- Você vinha caminhando e me pediu
ajuda. Eu vim. Eu só venho se me chamam.
- De certo, eu vinha rezando para
os santos e anjos, mas não denominei ninguém.
- As pessoas são assim mesmo, na
hora do medo chamam e depois não entendem ao chamado que fizeram. Você mortais são
engraçados.
- Como você gosta de histórias, vou
te contar. Senta aqui do meu lado.
Sentei ao lado dele, em outro
tronco de árvore cortada na beira da estrada, eu não tinha mais medo de nada.
- Eu sou um orixá. Tenho uma vasta falange, sendo responsáveis por legiões de grandes
energias, guardiãs de antigos mistérios da natureza, conhecedor do mundo espiritual
e suas variações de energias poderosas que atuam no universo.
- Um
orixá é igual a um santo da igreja católica?
- Se você
acha assim, podemos considerar. Cada um tem sua história, uns viram santos,
outros reencarnam e vão para umbanda, outros vão ser kardecistas. Cada um com
sua fé e religião.
- Se você
é um orixá é da religião de matriz africana? Estudei isso na faculdade.
- Sim.
Faço parte do Candomblé. Essa religião
nasceu aqui no Brasil com a vinda dos escravos, mas já existe há muitos anos no
mundo todo. Eu mesmo nasci no século passado em Paris.
-
Infelizmente essas religiões sofrem muitos preconceitos. As pessoas não
conhecem, acreditam nas diversas histórias e tem medo. Todo mundo tem medo do
que não conhece.
- Isso, é o sincretismo dos Orixás, que vieram
da África e aqui foram misturados com os santos católicos, pois os antepassados
negros não podiam adorar seus orixás, por exemplo, quando rezavam para São
Gerônimo, estavam mesmo era louvando a Xangô.
-
Lembrei-me da virada do ano, que todos vão pular sete ondas e pedir proteção
para Iemanjá, que para muitos é a Nossa Senhora dos Navegantes. Gente que faz
isso e depois critica as religiões de matriz africana, vai saber.
- Nossa
religião também tem rituais, assim como em todas as igrejas. Nos terreiros,
após as louvações, rezas e pedidos, chamam a entidade que irá vir para os
trabalhos, são entoadas cantigas especiais, têm festas, bebidas e comidas
também.
- Obrigada
pela conversa, aprendi muito com o senhor, mas tenho que ir, já está ficando
tarde.
- Boa
noite, bonequinha. E não esqueça que você conversou com o Exu Tiriri da
Calunga.
- Moça,
moça, acorda, chegamos, teu namorado está ali te esperando! Disse o cobrador
batendo no meu ombro, no ônibus.
- Acordei
e vi pelo vidro do ônibus, um senhor com seu chapéu e fumando um charuto ao
lado do meu namorado, os dois sorrindo pra mim.
Muiiito boa leitura. Amei. Parabéns Sissa. Aguardando mais.
ResponderExcluirLindo demais, sempre arrasando na escrita.
ResponderExcluir